Publicado em Portugal - Análise e debates políticos - 06 Apr 2018 14:24 - 3
Texto retirado do sítio: https://www.alagamares.com/portugal-e-o-brasil-um-artigo-de-loryel-rocha/
"O BRASIL NUNCA FOI UMA COLÔNIA!NOTA: O ARTIGO RESPEITA O PORTUGUÊS DO BRASIL ORIGINAL“A expansão portuguesa não foi, nem fruto do acaso, nem um feito político
da Coroa ou de cortesão esforçados, antes a missão de uma Ordem
iniciática.”
Manuel J. GandraO Brasil Não Foi Colônia é o título de uma conferência proferida pelo
historiador paulista brasileiro Tito Lívio Ferreira na Sociedade de
Geografia de Lisboa em 27/06/1957.
O Brasil Não Foi Colônia, longe de ser um título provocativo ou ingênuo,
configura uma chamada de atenção, lançada em meados do século XX, que já
na altura estava e, ainda está, na contramão da historiografia
nacional, submetida à um pensamento marxista, árduo defensor de uma
história republicana anômala, que privilegia as literaturas que se
esmeram em “desmontar” a memória da monarquia portuguesa e, por
conseguinte, do Brasil. Desafortunadamente, do outro lado do Atlântico, a
historiografia nacional portuguesa enfrenta cenários de “desmonte”
semelhante, embasados em fundamentos “aparentemente” distintos. As
razões para isso são múltiplas, mas, sustentadas numa hermenêutica
positivista, de saída, arbitrária e reducionista, sustentáculo das
literaturas de compromisso que preferem ignorar a interrogar, sem
penetrar a alma autêntica da terra e dos homens em busca de sua
verdadeira essência.
A história do Brasil e de Portugal foi a mesma história até o século XIX,
no sentido de que os hoje dois Estados faziam parte da mesma comunidade
nacional. Assim, as investigações que cobrem todo esse período devem
ser conduzidas investidas daquela porção de soberania que ultrape as
fronteiras do Atlântico. Indo mais e além, é mister, inclusive,
considerar que, se a formação histórico-social-religiosa e
político-administrativa de Portugal deita raízes na Galiza, berço da
nobreza portuguesa, por conseguinte, tais raízes são transplantadas para
o Brasil, de modo direto ou indireto estão também aqui encarnadas.
Assim, perpa um eixo Galiza-Portugal-Brasil que merece melhores
estudos, incluso, sobretudo, os respectivos mitos fundadores, sem os
quais a história de Portugal permanece como que lacrada à investigação,
como bem evidencia a obra de Manuel J. Gandra (in: Da Face Oculta do
Rosto da Europa).
Sobre a gravidade do “desmonte” desta herança, adverte Arlindo Veiga dos
Santos (in: Idéias que marcham no silêncio, 1962): O Presente que nega o
Pado não terá Futuro. Todos os séculos da história de uma Nação são
páginas de um só livro, de sorte que não se engrandece ou se enobrece
uma Nação subtraindo registros, caluniando sua fundação ou ajustando a
história ao convencionado. O “desconhecimento” destas lições é o
sustentáculo do credo marxista “a mais influente força obscurantista da
história contemporânea” (in: SALGADO, Plínio. Manifesto de Outubro de
1932 (Edição do Cinquentenário). Resulta deste cenário de “falta de
memória” uma lamentável lacuna na História e Identidade de ambos os
países, com graves prejuízos e repercussões para o Futuro, entendido
aqui como expressão do Quinto Império.
Ciente disso, ampliando horizontes na defesa da salvaguarda e da preservação,
sem preconceitos, da história e identidade luso-brasileira, está o
pensamento de Tito Lívio Ferreira. O Brasil Não Foi Colônia, conferência
proferida na Sociedade de Geografia de Lisboa em 27/06/57 constitui uma
espécie de tese que perpa duas obras do mesmo autor: A Ordem de
Cristo e o Brasil (Ibrasa, 1980) e História da Civilização Brasileira
(Gráfica Biblos, 1959), esta última, escrita em conjunto com seu irmão,
Manoel Rodrigues Ferreira. Afirma Luiz Tenório de Brito no Prefácio da
História da Civilização Brasileira: “Até metade do século pado a
palavra colônia era desconhecida da história tricentenária da comunidade
luso-brasileira. Foram os historiadores brasileiros que a introduziram
nas suas obras, Porto Seguro à frente. Portugal jamais o fez”. Na
elucidação desta tese, os autores traçam os argumentos comprobatórios e
afirmam, dentre outros dados, que dentro do universo de implicações da
palavra colônia é necessário distinguir entre naturalidade e
nacionalidade, mais, que, em fins do século XVIII, não se confundia
naturalidade com nacionalidade:
“Esse princípio jurídico da nacionalidade portuguesa dos brasileiros fora
estatuído claramente em 1605, pelo Conselho das Índias, mais tarde
Conselho Ultramarino Nessas condições, os portugueses de Portugal e
os portugueses do Brasil não se julgam colonos porque não eram. Assim,
os Reinos de Portugal e Algarves, as províncias europeias e as de
ultramar, inclusive o Estado do Brasil, componentes do Império Lusitano,
governavam-se pelo corpo de leis disciplinares sob o título “Ordenações
do Reino”, dividido em cinco livros que tratavam, o primeiro das
autoridades e tribunais, com os respectivos auxiliares; os segundos dos
direitos dos soberanos, privilégios da Igreja e outras pessoas; o
terceiro do processo civil; o quarto do direito privado e o quinto do
direito penal e processo civil. Feita a separação política do Reino do
Brasil do Reino de Portugal, a parte da legislação civil portuguesa
vigorou no Império do Brasil e na República até 1917, há 40 anos atrás
quando foi promulgado o Código Civil Brasileiro” (op. cit., 1959, p.
39-40).
Que o Brasil não foi colônia dizem-no João de Barros, Pero de Magalhães
Gândavo, Frei Vicente do Salvador, Antonil, Bluteau, Pedro Taques, Frei
Gaspar, Rocha Pita e todos os cronistas do Estado do Brasil, ou do
Brasil-Província. O fato de Bluteau definir, em começo do século XVII, a
palavra colônia, ele não quer dizer que o Estado do Brasil fosse
colônia, afirma Tito Lívio(op. cit., 1959, p.77).
Tito Lívio (1980, p. 67) falando sobre a imigração de casais portugueses que
vieram juntos com o Padre Manoel da Nóbrega afirma:
“Todos são portugueses, com exceção de Aspicuelta Navarro, porque natural de
Navarra, na Espanha. Até fins do século XVIII, não existia o princípio
da nacionalidade instituído em 1792, com a proclamação da primeira
República Francesa. Nesse caso, o valo tinha apenas naturalidade e
não nacionalidade. E se estivesse a serviço do Rei de Portugal, era
considerado português para todos os efeitos.
O autor alerta igualmente para a imprudência literária que faz confundir
ou sobrepor o significado da palavra colônia à idéia de feitoria (com
sentido similar ao aplicado às colônias militares romanas):
De 1500 a 1532 os Portugueses construíram feitorias na costa da Província
de Santa Cruz, para defender a terra dos piratas estrangeiros. Essas
feitorias eram semelhantes às colônias militares estabelecidas pelos
romanos como postos avançados no território conquistado. Nessas colônias
militares romanas vigorava apenas o Direito Romano. Criado o município,
o território era elevado à província romana. E ao lado do Direito
Romano se formava o direito municipal, ou direito público dos munícipes.
Ora, em 1532 os portugueses criam o primeiro município lusitano
instalado em São Vicente. As feitorias pam a fortalezas. Perdem o
sentido militar primitivo. E ao lado das Orientações do Reino onde se
disciplinavam as leis desde Afonso V de Portugal, começa a surgir, de
1532 em diante, com o regime municipal luso-brasileiro, um código local
para uso dos munícipes, para uso da terra (op. cit., 1959, p.37-38).
Barbara Freitag (in: Capitais migrantes e poderes peregrinos, 2009, p.43) cita a
obra de Nestor Goulart Reis Filho e seus colaboradores Beatriz
Piccolato Siqueira Bueno e Paulo Júlio Valentino Bruna (Imagens das
vilas e cidades do Brasil colonial, 2001) que reescreve a formação da
sociedade colonial alertando para um fato inédito ou pouco conhecido:
Poucos sabem que quase todas as vilas e cidades mais antigas tiveram muros e
portas, como grandes fortalezas. Poucos sabem também que muitas delas
foram traçadas por engenheiros militares e tinham formas geométricas
regulares. E muito poucos tiveram notícias sobre as aulas de Arquitetura
Militar, que formaram esses engenheiros e partir de 1696, inicialmente
na Bahia e em Pernambuco e, depois, também no Rio de Janeiro e no Pará.
Freitag afirma que os estudiosos do período colonial negligenciaram o estudo
das cidades do período colonial, disseminando a crença de que os
portugueses teriam sido “semeadores” sem projeto e racionalidade de
ocupação territorial na ocupação do espaço urbano brasileiro: “já começa
a haver consenso entre pesquisadores brasileiros e portugueses de que
havia uma atividade planejadora regular do mundo luso-brasileiro nos
tempos de colônia”.
À parte as providenciais “negligências”, tanto Freitag quanto Reis Filho
alertam para uma “atividade planejadora regular” da Coroa no período
colonial. Tal planejamento evidencia as características “militares” das
cidades da “colônia”, corroborando a tese das feitorias (futuras vilas e
cidades) como “colônias” militares, de Tito Lívio, o que incita,
evidentemente, a ampliar o olhar sobre a forma de administração da
Coroa.
Quanto a isto, é pertinente perguntar sobre a origem e razão do “caráter
militar” desse planejamento, porque, o argumento que se enta sobre a
idéia de “defesa” do território comunga uma visão reducionista do
unto. Isto porque, é consabido que Portugal não foi um império de
conquista, portanto, o número de homens em armas era bastante reduzido.
Ademais, é deveras sintomático o fato de ter sido a Ordem de Cristo a
autora, patrocinadora e mentora dos Descobrimentos Portugueses,
autêntica sucessora da Ordem do Templo de Portugal, esta, de consabido
cariz militar e monástico. A Ordem do Templo foi uma cavalaria
espiritual à conquista do mundo. A sua fama militar e monástica tem uma
vertente exterior e uma vertente individual, contemplativa, ascética.
Portanto, o testemunho militar deve ser consoante a missão umida pela
milícia templária. Concerne investigar criteriosamente o quanto da
missão templária foi transposta (e se o foi e como) para o povoamento e
formação do Brasil. Some-se a isso a relevante questão de a Ordem de
Cristo ter exercido uma influência notável no povoamento e na formação
do Brasil e, de ser o Brasil patrimônio da Ordem de Cristo, e não da
Coroa Portuguesa:“D. João II, rei de Portugal, e o rei de Castela inam o Tratado de
Tordesilhas, em 07 de Junho de 1494 E im, seis anos antes da
viagem de Pedro Álvares Cabral, já Portugal reivindicava a posse da
terra do Brasil, para o patrimônio da Ordem de Cristo, segundo as bulas
anteriores dos Papas D. Martinho V., D. Nicolau V e D. Calixto III,
porque os descobrimentos portugueses eram custeados pelas rendas da
Ordem de Cavalaria de Nosso Senhor Jesus Cristo, isto é, a Ordem de
Cristo
Traçada a fronteira ideal das terras pertencentes a Castela e das terras
adjudicadas à Ordem de Cristo, pelo Tratado de Tordesilhas, em 1494,
quatro anos mais tarde, em 1498, Duarte Pacheco Pereira, mandado por D.
Manuel I, cruza o Atlântico de norte a sul, para localizar
geograficamente o patrimônio ultramarino da Ordem de Cristo, no novo
continente e chega até o cabo de Santo Agostinho, no litoral do atual
Estado da Paraíba. E o Papa Calixto III, pela Bula de 13 de março de
1455, “declarara inerentes ao mestrado da Ordem de Cristo em Portugal a
administração e padroado das terras adquiridas e por adquirir, desde o
Cabo Bojador até à Índia (Ásia) e Xisto IV confirmara ao rei D. João II
(de Portugal) as bulas de seus predecessores”(Cf. Francisco Adolpho de
Varnhagen. “História Geral do Brasil”, T. 1- p.69).
O diagnóstico acima separa as jurisdições pertencentes à Ordem de Cristo
das da Coroa Portuguesa (igualmente, lança luz sobre o Pacto do Padroado
e sobre o fato de a maioria dos reis portugueses – de 19 dos 34- terem
sido excomungados pela Igreja de Roma, o que rebate a verdade aceita da
absoluta catolicidade de Portugal!). É consabido o fato de no ano de
1420, o Infante D. Henrique, duque de Viseu, filho de D. João I, foi
colocado à frente da Ordem de Cristo. Todos reconhecem neste nome o
autor das descobertas e das colônias europeias; o que menos se sabe fora
de Portugal, é que estas descobertas eram feitas à custa desta Ordem e
em seu proveito. Os reis de Portugal, para animar estes cavaleiros, lhe
concederam a princípio a propriedade dos países que poderiam adquirir,
reservando para si a soberania. Foram tão rápidos os seus progressos e
tão consideráveis as suas aquisições, que, mesmo em vida do Infante, a
prudência exigiu outros contratos. Em vez da propriedade dos países
adquiridos, que volveu à Coroa, concederam-lhes a jurisdição civil,
certa superioridade militar, os dízimos e a jurisdição eclesiástica, com
o consentimento dos papas. Anos depois, a boa política pediu que a
supremacia de uma Ordem, tão rica e poderosa, fosse para sempre anexada à
pessoa do rei, como de feito se conseguiu. Desde o cabo Bojador, onde
tiveram princípio estas descobertas, não era permitida a navegação a
navio algum português que não hastee a bandeira da Ordem; além deste
cabo os portugueses não usavam outra” (Abade Correia da Serra. Os
verdadeiros sucessores dos templários e o seu estado em 1805. In:
Cadernos da Tradição. Lisboa: Hugin, 2000, p.59-70). O rei de que se
trata foi D. João III. Tal política coincide com o início da decadência
nacional propiciada pelo enfraquecimento da Ordem de Cristo, motivada
pela supracitada reforma, conduzida por frei António de Lisboa, a mando
do rei D. João III, em 1529, que mandou incendiar e destruir todos os
documentos respeitantes à Ordem de Cristo.
Manuel J. Gandra (in: O Projecto Templário e o Evangelho Português, 2013, p.
24), demonstra que, ao contrário, Portugal umiu, em nome da Ordem do
Templo, um compromisso ecumênico, interrompido (ou adulterado) pelo
incensado D. João II, que depois de inar o Grão-Mestre da Ordem de
Cristo ume para si esse cargo, bem como, a jurisdição sobre o rico
patrimônio da Ordem, subvertendo a missão da milícia templária:
“Recordo que foi o mesmo monarca que, pela sua própria mão, inou o
Grã-Mestre da Ordem de Cristo (seu cunhado), certamente, porque este não
tencionava abdicar daquilo que, até do ponto de vista canônico,
constituía o cerne moral e religioso da Milícia.
Além disso, D. João II promoveu, em 1485, a reforma do brasão real. A
chamada operação de endireitar o escudo (i. e., os escudetes das
ilhargas) terá subvertido irremediavelmente o significado das peças que
empunham as armas nacionais, as quais na sua configuração original
representavam a Alma do Mundo, de acordo com Plotino: os três escudetes
superiores voltados para a Inteligência (ou seja, para o interior) e o
do meio e o inferior, voltados para a matéria (i. e., para o exterior).
Ao preceder im, D. João II terá entregue ao Corpo do Mundo a direção
do destino nacional, transformando-o, doravante, numa mera questão de
“Secos e Molhados.
No entanto, mesmo após o inato do Grão-Mestre da Ordem de Cristo, o
Projeto Templário continua a subsistir, haja visto que as palavras MORE e
MROE, tantas vezes presentes na eclíptica da esfera armilar de D.
Manuel, com o significado de Manuel Orbis Rex est e Manuel Rex Orbis
est, claramente reinvindicam um estatuto imperial, cuja tradição remonta
à cristofânia de Ourique, com inequívocas ligações com o Rei do Mundo e
a profecia do Quinto Império. Compele acorrer que numa sequência
tradicional, Vasco da Gama (1497) e Pedro Álvares Cabral (1500)
receberiam das mãos de D. Manuel I a bandeira da Ordem de Cristo, como
estandarte das navegações. Ressalve-se que a cartografia portuguesa
ostenta bandeiras da Ordem de Cristo pelo menos desde a carta de Pedro
Reinel em 1500. Mas, que ideal perseguem os Templários?
“Não são de todo subreptícias, nem dispiciendas, as conotações entre o ideal
sinárquico dos templários, isto é, a sua demanda da equanimidade
universal ( no seio de uma hierarquia de competências), com o corpus
doutrinal derivado do pensamento do cisterciense Joaquim de Fiori e
larizado pelos espirituais franciscanos. De outro modo, como
justificar que os mesmos monarcas que protegeram os templários se
tivessem empenhado na difusão do joaquimismo, cujos princípios
religiosos, éticos e políticos se baseavam na ideia de que, sob a
influência sucessiva de cada uma das três pessoas da Trindade, as
criaturas se haviam de tornar puras, como os meninos, para ganhar o
Reino dos Céus. Foi este ideário que, como é público, imortalizou Santa
Isabel e Dom Dinis.
A expansão portuguesa não foi, nem fruto do acaso, nem um feito
político da Coroa ou de cortesão esforçados, antes a missão de uma Ordem
iniciática.
Motivada por expectativas milenaristas e messiânicas coletivas, sincreticamente
compendiadas no Auto do Império, a gesta marítima lusa resolve-se na
demanda do Paraíso Perdido, esse Centro Espiritual supremo só
alcançável, garantem-no escritos espirituais medievos como o Conto do
Amaro, a Navegação de são Brandão, o Livro de José de Arimatéia e o Orto
do Esposo, pelo nauta audaz que, em demanda do seu destino, embarque
nas naus da iniciação e empreenda a travessia do Oceano da Alma, modelo
dos oceanos do mundo, para dilatar Fé e Império (Manuel J. Gandra,
2013).
“Dilatar Fé e Império”… o engenho e arte decantados por Camões está na contramão
da tese que perfila atribuir uma má gestão e descaso da Coroa
Portuguesa na chamada tomada de posse definitiva do Brasil depois de
1500. O tema dos Templários portugueses, salvo raras e honrosas
excessões, tem sido ignorado, omitido ou subvalorizado.
Consigna Silva que a historiografia registra, desde muito cedo, os precoces e
estreitos laços entre a Ordem do Templo e os círculos aristocráticos
portucalenses. A Ordem do Templo desempenhou papel fundamental tanto na
formação da nacionalidade portuguesa quanto na expansão urbana
portuguesa, ocorrida ao longo dos séculos XII e XIII. Acrescido a isso, a
Ordem do Templo teve papel decisivo nas guerras de Reconquista da
Península Ibérica, exerceu poderosas influências em vários reinos da
Europa e foi decisiva para as Cruzadas. Vale frisar que, no tocante a
este último item, vinculou-se de tal modo a imagem Templária às Cruzadas
que sua vital importância e presença em Portugal foi abafada.
Evidentemente que os Templários tem muito a ver com as Cruzadas. No
entanto, os Templários portugueses configuram um tipo muito particular
de templário. E a própria Ordem do Templo em Portugal se desenvolve de
modo bastante específico.
Relações extremamente complexas se teceram entre os reis portugueses e a Ordem
do Templo, onde apesar de documentado, impera o véu de silêncio sobre a
relação da Coroa Portuguesa com os Templários e, da Ordem de Cristo com o
Brasil. Isso não só porque o tema sobre os Templários é carregado de
estigmas. Reações bipolares acontecem no trato dessa questão, que oscila
entre a admiração incrédula, a discrição da ignorância, o preconceito
pretencioso e a negligência erudita. Mas, sobretudo, porque, ainda se
ausentam das pesquisas historiográficas o diálogo e os novos horizontes
que a transdisciplinaridade estará mais habilitada a fornecer que a
engessada hermenêutica positivista.
Nesta conformidade, uma vez alienada a presença e a participação da Ordem de
Cristo no Descobrimento do Brasil, espargido o seu dinamismo específico e
perdidas as chaves destinadas à sua leitura e interpretação, abre-se
inexoravelmente um vazio histórico que só pode ser transposto uma vez
que se recupere e se esclareça o que foi efetivamente o Projeto
Templário.
“De facto, salvo algumas monografias e contributos pontuais com direito a
destaque, as Ordens do Templo e de Cristo não conheceram ainda quem,
numa perspectiva global, sistemática, sustentada (quer tradicional, quer
documentalmente) e lusíada se aventure a resgatar a sua história,
projeto, práxis e patrimônio.
A utilidade do empreendimento chegou a merecer, convém recordá-lo o
reconhecimento de autoridades como Pedro A. de Azevedo ou Jaime
Cortesão, o qual sublinharia ainda a necessidade de conduzir tal estudo
ponderando o quanto do tesouro templário (espiritual, mas também
material) terá sido investido na preparação e concretização da expansão
marítima, bem como na consolidação do Império português (Gandra, op.
cit., 2013, p.22).
Essa parece ser a aspiração que tanto Tito Lívio quanto Manoel R. Ferreira
tinham em mente quando se propuseram a pesquisar sobre as conexões entre
a Ordem de Cristo e o Brasil. Apelam incessantemente para a importância
do “eixo templário” na construção da totalidade da visão que norteia o
Descobrimento do Brasil, indo buscar o início de um tal projeto com a
Ordem de Cristo. Nisto reside sua virtude.
Contudo, cabe acrescentar mais algumas considerações para encerrar esse unto.
As obras de ambos os irmãos não tratam da decadência nacional
portuguesa propiciada pelo enfraquecimento da Ordem de Cristo, que tem
como marco basilar o inato do Grão-Mestre da Ordem por D. João II,
o “Príncipe Perfeito”. Uma vez que o ideal nacional imbuído de um
sentido missional preconizado pela Ordem de Cristo (e umido
integralmente pela Coroa até D. João II) se arrefece ou transmuta, de
resto, sofrem as consequências todo o planejamento do Projeto Templário,
incluso o Descobrimento do Brasil e a forma como a Coroa conduzirá suas
ações e decisões em todo o império ultramarino.
Para o contributo do enfraquecimento da Ordem de Cristo e, por conseguinte,
da decadência de Portugal, está D. João III que sucede o pai D. Manuel I
em 1521, aos 19 anos. D. João III manteve a equipe governante do pai,
mas, abandonou seu projeto Imperial (que seria retomado por seu neto D.
Sebastião I, (projeto de Império decantado por Fernando Pessoa). Dividiu
o Brasil em Capitanias-Hereditárias. Era extremamente religioso
(católico) e subserviente à Igreja de Roma a ponto de permitir a entrada
da inquisição em Portugal. Longe ser uma coincidência, é no seu
reinado, em 1529, que frei António de Lisboa levou a cabo a reforma da
Ordem de Cristo, destruindo e queimando todos os arquivos da Ordem,
praticamente dissolvendo-a e, transformando-a numa ordem de clausura. D.
João III é tido como pai-fundador e protetor da Companhia de Jesus, a
quem confia a missão de “irradiar a fé cristã”, um contraponto ao ideal
templário de dilatar Fé e Império. D. João III nomeia o Pe. Manoel da
Nóbrega primeiro Secretário da Educação do Estado do Brasil para
estabelecer a rede espiritual da educação luso-brasileira, fazendo com
que, durante longos anos o ensino público de Humanidades só se
ministre nos Pátios da Companhia de Jesus. Os jesuítas eram
professores pagos pela Coroa Portuguesa. É também deveras sintomático os
seguintes fatos: o episódio das Bandeiras e dos Bandeirantes envolvendo
jesuítas portugueses e os jesuítas espanhóis; o fato de estar a
Companhia de Jesus diretamente envolvida nas questões da mineração do
Brasil “colônia”; o envolvimento dos jesuítas com a revolta de Amador
Bueno, episódio separatista que arrolava à São Paulo separação da Coroa
Portuguesa. De todos estes episódios, o dos Sete Povos da Missões
constitui o caso mais emblemático e trágico envolvendo jesuítas,
portugueses e índios. Muito embora Tito Lívio (A Ordem de Cristo e o
Brasil) distingua sobremaneira a atuação dos jesuítas portugueses dos
jesuítas espanhóis, Frei Bernardo da Costa (in: Inéditos da Crónica da
Ordem de Cristo) apresenta um Compêndio Histórico sobre os jesuítas e a
Ordem de Cristo que contém denúncias graves. Frei Bernardo acusa os
jesuítas de se apossarem não só do patrimônio templário pertencente a
Ordem de Cristo, bem como, de intentaram umir o seu papel no
desempenho do ideal sinárquico. Este documento elucida os estragos e
ruínas que a Companhia de Jesus fez ao Reino e aos templários. Não sem
razão, Gandra afirma que D. João II ao mudar o destino nacional o
transforma numa questão de “Secos e Molhados”, ou seja, numa mera
questão de finanças, de procura por riquezas materiais, caminho
diametralmente oposto ao perseguido pela Ordem do Templo e sua sucedânea
a Ordem de Cristo. O início da decadência de Portugal, com claras
repercussões para a futura história brasileira.
No tocante à questão do referido desempenho do ideal sinárquico dos
jesuítas em solo brasileiro, Wilson Martins (in: Historia da
inteligência brasileira (1550-1794), vol. I. São Paulo: T.A. Queiroz,
1992, p.13-14), afirma que os dados da Companhia de Jesus revelam
algumas singularidades, onde percebe-se um plano de “conquista
espiritual”, refletido na estratégica instalação e disseminação
geográfica dos colégios jesuítas, que rejeitavam tudo que viesse a ser
profano. Alerta para o fato de o fundador português da Companhia de
Jesus, o Pe. Simão Rodrigues ser também o “implacável e encarniçado
denunciador de Damião de Góis perante os tribunais da Inquisição”.
Damião de Góis, comendador da Ordem de Cristo, guarda-mor da Torre do
Tombo, cronista-mor do Reino, embaixador de Portugal nas cortes da
Europa, foi um dos maiores pensadores portugueses. Personagem importante
para os planos do rei D. Sebastião, que em 1572, tinha conseguido do
Papa Pio V a autorização para (ré)-reformar os estatutos das ordens
religiosas e militares de Cristo, Aviz e Santiago. Pretendia o rei fazer
renascer a antiga força militar destas ordens. Neste quesito, Damião de
Góis era um personagem central. O jovem rei afastava-se do seu tio,
Cardeal-Inquisidor (futuro rei de Portugal) e dos dois padres jesuitas
que o haviam educado. Damião de Góis foi inado. Tito Lívio (op.
cit.,1980) apresenta a personalidade “ressentida” e a “sede de poder”
que apresentava o Pe. Simão Rodrigues.
No entanto, embora tenha havido uma quebra de harmonia, o ideal sinárquico
dos templários pode ser vislumbrado nos reis seguintes à D. João II,
notadamente em D. Afonso V, D. Manuel I, D. Sebastião I, D. João IV e D.
João VI. Dos Descobrimentos Marítimos (1500) até a proclamação da
Independência do Brasil (1822) Portugal teve 12 Reis, suprimindo-se o
Cardeal-Rei D. Henrique (1580) e a Dinastia Filipina (1640). Sendo o
Brasil Província de Portugal, estes reis também pertencem a história
brasileira, pois, são igualmente reis do Estado do Brasil.
Consigna Tito Lívio (1980, p. 57) sobre o nome Terra de Vera Cruz atribuído ao Brasil:
“Alí não foi hasteada a bandeira do Rei, a bandeira da Coroa Portuguesa,
mas, a bandeira da Ordem de Cristo, porque esse patrimônio lhe fora
adjudicado pelos Papas Martinho V, Nicolau V e Calisto III, no século
XV. O fato de a terra descoberta em 1500 receber o nome de Província
de Santa Cruz está explicado”.
Estes breves traços são suficientes para se verificar que a matéria que
envolve a palavra “colônia” aplicada ao Brasil não é matéria dispicienda
e “dá panos para a manga”, segundo o dito lar. Este fio de Ariadne
perpa toda a Dinastia de Avis e dos Bragança para desembocar nos dias
de hoje.
Assim, constitui matéria de alta relevância os acontecimentos históricos
envolvendo a Ordem do Templo e sua sucedânea, a Ordem de Cristo no
tocante as matérias respeitantes à história do Brasil. Suprimi-las, ou
antes, delegar exclusivamente à Portugal tal herança, é uma fórmula bem
eficaz de escamotear a história.
Fernando Pessoa (Mensagem), de modo lapidar, diz:
Cumpriu-se o Mar e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal.Vaticina a poetisa e folclorista brasileira Anna Maria Dutra de Menezes de
Carvalho(in: As Brasilíades), entendendo ser chegada a hora de quebrar o
silêncio:
É difícil atingir o mistério sagrado
que envolve o Brasil em oculta intenção
perguntar qual Missão, intuir qual mestrado
ilumina o futuro desta nossa nação.
E quando este gigante de repente acordar
vão rugir pororocas, vão cantar minuanos
e os mitos secretos e os tesouros do mar
surgirão nos espaços, sagrados, profanos,
e será revelado em seu credo abismal
o silêncio de Deus, pela voz da verdade
e o Brasil transmutado, paraíso ideal
será Ele, só Ele, por toda a eternidade! "
O Brasil é Portugal e Angola é Nossa!
AVE VICTORIA!
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Comentários (3)
Da proxima vez edita o texto para ficar mais interactivo e virtual .Fiquei com os olhos a sangrar pela falta de parágrafos.
Mas o conteúdo nao esta nada mal.
Votado
nuno258 Grato pelo comentário. Realmente a edição ficou ruim pois a configuração de textos no eRev não é das melhores.